Conheça Giuseppe, a IA “cozinheira” que está inovando nossa comida

Conheça Giuseppe, a IA “cozinheira” que está inovando nossa comida

“No futuro, serão os robôs que irão decidir o que a gente vai comer ou não”, já diriam os maiores apocalípticos sobre a tecnologia. Mas sabe de uma coisa? Eles não só estão certos, como esse futuro já chegou.

Cada vez mais, as empresas da indústria alimentícia tentam implementar soluções de IA para desenvolver novas receitas e acelerar a produção, e o que não falta são empresas que utilizam esta tecnologia para tentar promover a disrupção das cadeias de distribuição tradicionais e criar alternativas mais saudáveis para os produtos que fazem parte da vida das pessoas.

E uma dessas empresas é a chilena NotCo, que tem como grande diferencial a IA Giuseppe, que foi treinada para analisar alimentos de origem animal e sugerir substituições vegetais que mantenham as mesmas características do produto original. E quem revelou pra gente os segredos de como o Giuseppe funciona foi Cynthia Pereira, diretora de R&D da NotCo, que foi nossa convidada no episódio 11 do Innovation Hub Show.

Uma IA “cozinheira”

Mas como exatamente funciona uma IA em um setor tão “mão na massa” quanto o de alimentos? Afinal, as IAs não conseguem sentir nenhuma das características que tornam um alimento algo único – o sabor, a textura e o aroma. E entender como a Giuseppe funciona pode ajudar a afastar um pouco o medo que muitas pessoas têm da tecnologia, já que ele não substitui os chefs, nutricionistas, botânicos e engenheiros de alimentos que trabalham na NotCo, mas ajuda-os a encontrar soluções de forma mais rápida.

“Eu peço ‘Giuseppe, por favor, olhe todos os artigos científicos que já foram publicados sobre ketchup’” conta Cynthia no podcast. “Aí eu falo pra ele aprender as funções desse ingrediente, e depois ir na minha base de dados e pegar todos os ingredientes que fazem a mesma coisa.”

Com essas informações, o Giuseppe consegue fazer dezenas, centenas ou até milhares de combinações de possíveis substituições para a criação de um novo produto, usando outros ingredientes, mas que mantenha cada uma das características do original. Esta escolha de possíveis substitutos é feita em nível molecular, e muitas vezes gera resultados um tanto inesperados: por exemplo, o aroma idêntico ao de um leite de vaca encontrado no NotMilk veio de uma sugestão da IA de misturar as propriedades do abacaxi com o repolho.

E isto é possível pela forma como especialistas e a IA trabalham em conjunto: a NotCo desenvolveu todo um banco de dados onde chefs, botânicos e engenheiros de alimentos definem as características de cada ingrediente, desde questões moleculares até coisas como gosto, textura e a facilidade de encontrar essa matéria-prima para uma produção em larga escala. O Giuseppe então “varre” este banco de dados, cruza os dados moleculares (onde ele encontra as substituições que irão manter as mesmas características do produto original) com as informações mais “humanas” definidas pelos chefs e os dados industriais carregados pelos engenheiros, e então sugere uma meia dúzia de receitas que podem dar certo. Os chefs de cozinha da NotCo então pegam essas receitas, testam todas elas e passam um feedback para o Giuseppe, definindo as características de cada uma delas (gosto ruim, gosto bom, textura estranha, aroma agradável, etc.). Com base nessas informações, a IA então gera uma nova leva de cinco ou seis receitas – e normalmente já nessa segunda leva os chefs encontram aquilo que estavam procurando: uma forma de desenvolver um alimento igual ao original, mas utilizando substitutos mais saudáveis.

Mas, claro, mesmo com essa tecnologia de ponta nem tudo pode ser facilmente substituído: “O principal desafio é em textura mais do que em sabor”, comenta Cynthia, “quando você pega uma picanha, ela é um músculo, que vai ter essa complexidade onde eu vou morder e aí uma parte é fibra, outra parte é gordura. E aí, como você reproduz isso? Essa sensação de um músculo, que é completamente diferente, sabe?”

Outra dificuldade é quando você encontra uma receita perfeita, mas não consegue replicá-la numa escala industrial. Cynthia conta a história de um substituto de atum que a NotCo desenvolveu no laboratório do Chile, e que era exatamente igual ao peixe em todos os aspectos. Mas, quando o produto saiu da cozinha de amostra e foi tentar ser replicado em uma escala industrial a receita não ficava igual, tinha algumas coisas ali que simplesmente não eram possíveis de replicar sem a habilidade de um chef – e, por isso mesmo, a empresa decidiu não lançar este substituto de atum no mercado, já que o produto que chegaria às prateleiras não teria a mesma qualidade que obtiveram durante os testes de experimentação.

Inovando todo um mercado

Muita gente pode até brincar que a NotCo é mais uma empresa de tecnologia e inovação do que uma empresa de alimentos, mas isto está bem próximo da realidade. Primeiro porque, de acordo com a diretora de R&D da empresa, quase metade dos funcionários pertencem à área de tecnologia e trabalham diretamente criando novos algoritmos e módulos para treinar o Giuseppe. E segundo que, como toda empresa de inovação e tecnologia, a NotCo possui um setor para oferecer serviços B2B que é bastante procurado pela indústria alimentícia.

“Há quatro anos atrás eu falaria que isso nunca ia funcionar, porque como a indústria que faz chocolate A e a empresa concorrente dela, que faz chocolate B, vão ambas contratar a gente? Eles não vão aceitar,” revelou Cynthia durante o episódio 11 do podcast. “E, pasmem, eles aceitaram sim! Todo mundo queria entender como a inteligência artificial funcionava, fazer algum projeto com a gente, provar se a tecnologia funcionava.”

Apesar do objetivo da NotCo ser criar produtos à base de vegetais que possam substituir alimentos de origem animal, não é apenas com esse tipo de substituição que o Giuseppe consegue trabalhar. A IA da empresa também pode ser usado por quem quer diminuir a quantidade de sal de algum alimento industrializado, ou substituir o açúcar de um suco de caixinha sem alterar o gosto que os clientes deles já se acostumaram. 

E são justamente essas alterações, que parecem tão simples, as mais difíceis de se fazer sem que haja nenhuma perda de sabor – algo que o cliente irá entender como uma queda na qualidade do produto. Como bem explica a Cynthia: “Como a questão do sal: você quer fazer um produto com menos sal, mas ele é um ingrediente de sabor. Então se você só diminuir a quantidade, o seu cliente vai falar que o produto era bom e de repente ficou ruim. Então como você resolve esse problema?”

É justamente nessa questão que a tecnologia pode fazer a diferença: “A ideia é no que mais que a tecnologia pode ajudar,” continua ela, “Então mesmo num produto que seja de origem vegetal – por exemplo, o ketchup – mas qual que é a barreira do ketchup? O açúcar. Será que eu consigo fazer um ketchup sem açúcar? Então essa é a ideia: encontrar a barreira que os consumidores enxergam em cada produto, e aí entender onde que a gente pode usar a tecnologia para superar essa barreira.”

O futuro está no seu prato

Se você não for negacionista, com certeza já sabe o impacto positivo que a diminuição do consumo de carne pode causar ao meio ambiente. E tecnologias como o Giuseppe estão aí para provar que é possível, sim, substituir alguns alimentos do nosso dia a dia para uma versão mais saudável – tanto para nosso corpo quanto para nosso planeta.

Claro, este é apenas um pequeno passo, mas é incrível o potencial da IA para nos ajudar a ter uma vida mais confortável e saudável. E, se depender do Giuseppe, logo logo o “churrasco vegano” vai deixar se ser sinônimo de algo que é meio desconfortável para a população no geral e se tornará, apenas, um churrasco.

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