Como o caos já afeta – e vai afetar ainda mais – a sua empresa

Como o caos já afeta – e vai afetar ainda mais – a sua empresa

“A gente de fato vive um momento de transformação muito profunda.”

A frase dita por Luiz Candreva no comecinho do episódio 6 do Innovation Hub Show meio que ecoou tão forte por todo o episódio que atravessou as barreiras do som (e dos serviços de streaming) para abrir este texto do blog. Ela, por si só, já é uma frase forte, e fica mais potente quando examinamos o currículo de quem a disse: um futurista, head de inovação da Ayoo, professor na HSM e na Fundação Dom Cabral, Colunista da CNN Brasil e board member na Boali.

De fato, são tantas mudanças acontecendo nos últimos anos que a sensação é de estarmos navegando em meio ao caos. E isso não é sentido até pelas pessoas: as empresas também compartilham do mesmo sentimento. São tantas mudanças – de tecnologia, de mercado, de geração, da organização do próprio trabalho – que é cada vez mais difícil prever o futuro, quais serão as novas tendências ou mesmo se o produto ou serviço que eu ofereço continuará fazendo sentido no ano que vem.

Mas há uma luz no fim do túnel: essas questões só existem porque nos preocupamos muito com o agora e o futuro próximo. Se conseguirmos trabalhar nossa visão para extrapolar o tempo e nos afastar do que nos aflige no presente, é possível ver que a tendência é sempre de melhora.

Os mesmos novos tempos, mas diferente

Não é a primeira vez que o mundo passa por grandes mudanças: elas ocorrem de tempos em tempos, e sempre seguindo o mesmo ciclo. Não importa se falamos das grandes Revoluções Industriais, da chegada do computador, do advento da internet ou mesmo da invenção da linha de produção, o ciclo costuma ser sempre o mesmo: num primeiro momento, redução de empregos e fechamento de empresas; e então, conforme nos acostumamos com a nova tecnologia, vamos percebendo que ao mesmo tempo que ela resolve muitos problemas ela também cria novos, e então há uma geração de empregos maior do que os que foram perdidos, e a criação de áreas de atuação que antes não eram nem cogitadas.

Mas, ao mesmo tempo que o novo ciclo de mudanças é, de modo geral, o mesmo de sempre, Candreva aponta que há uma mudança fundamental neste que estamos vivendo agora: o fato de não termos mais o monopólio da criação. Na sua participação em nosso podcast, o futurista afirmou que, além das características que eu já citei aqui, algo comum em todas essas mudanças era que os humanos tinham o monopólio sobre o pensamento e a criação em todas elas – e é justamente este monopólio que está sendo perdido na atual revolução das IA.

E ele acredita que é justamente esta “concorrência” que têm contribuído para a impressão de que estamos passando por uma revolução maior e mais caótica do que as anteriores. Mas, se conseguirmos extrapolar nosso olhar para um futuro realmente distante, será possível ver que este ciclo não será assim tão diferente dos outros, e que nós estamos apenas passando pela fase de “afunilamento” comum em todos eles.

Uma breve visão do futuro

Para o futurista, um indicador claro de como uma das mudanças que estamos vivendo são, de modo geral, benéficas, é a facilidade de acesso à música. Há 200 anos, ouvir música era algo extremamente caro, e exigia que você contratasse uma orquestra ou banda inteira para tocar na sua casa ou evento, ou então fosse pessoalmente até o local onde elas tocariam. Há 120 anos isso se tornou um pouco mais barato e cômodo, com a criação do rádio. 50 anos depois, ouvir música tornou-se ainda mais cômodo e barato com a criação do vinil. E hoje, com apps como Spotify e YouTube Music, o custo para ouvir sua música onde quiser tende a zero – afinal, os planos de assinatura oferecidos por esses serviços são apenas para você não ter que ouvir anúncios, a música está disponível tanto para quem paga quanto para os usuários que não assinam nada.

Candreva acredita que este é o destino de quase tudo – tornar o acesso tão fácil e barato que você não ter uma fonte de renda não significará que você não terá acesso a algo. Ou seja, é a revolução social trazendo um novo tipo de revolução cultural: a ressignificação do que é ser pobre. Porque antes você ser pobre, ou não ter um emprego, impedia o seu acesso a muitas experiências culturais que apenas aqueles que tinham dinheiro podiam acessar – e isso é algo que já está mudando. Esta posição bem positiva sobre as mudanças é algo compartilhado também pelo Igor Lopes, host do podcast e fundador do Innovation Hub: “Eu acho que a tecnologia tende a gerar cada vez mais abundância, e isso é uma ferramenta para a resolução de vários problemas.”

Mas isso não quer dizer que tudo vai se resolver sem alguns tropeços pelo caminho. Candreva afirma que “endereçando a questão de uma maneira mais próxima no tempo, muito em breve a gente vai enfrentar um grande problema social que é esse vale, que é a transformação deste modelo [econômico e organizacional] atual para o próximo. E a gente vai ter que criar uma rede de segurança social, ou alguma coisa do tipo, para conectar essas pessoas e garantir que elas passem por esse vale.” 

Ele ainda lembra que isto não é algo exclusivo apenas do momento atual, mas todas as grandes mudanças tiveram este tipo de “rede social” para ajudar na transição de um momento histórico para o próximo. O grande problema é que, em nenhum outro momento, esta transição ocorreu tão rápido quanto a que estamos vivendo hoje. Será que teremos tempo de criar essa rede de apoio a tempo?

Como focar com tantas mudanças?

E no meio de todas essas mudanças, vemos muitas empresas tão perdidas que não sabem nem mesmo identificar o que fazer para atravessar esse momento, e acham que a solução é simplesmente instalar as tecnologias mais recentes nas suas operações. E a Déborah Oliveira, diretora de conteúdo do IT Fórum, foi rápida em apontar qual o problema disso: “Acho que a questão não é nem a tendência da tecnologia: é se questionar o porquê. Qual o motivo de você querer ter essa tecnologia? Falta esse questionamento, né? Por que você tá fazendo? Qual seu objetivo? Onde você quer chegar?”

Isto é uma característica que também foi percebida pelo Igor: “Eu acho que as empresas têm muito dessa coisa de ‘nossa, isso é tendência, eu tenho que fazer’ etc. Só que se a gente pensar no mundo real, e na velocidade que as coisas estão acontecendo, talvez seja mais saudável a gente pular determinada tendência e já procurar a próxima.” Ele ainda cita como bom exemplo disso o que acontece na Fórmula 1: quando uma montadora percebe que o carro dela está com um desempenho muito abaixo das equipes adversárias, ela já meio que “desiste” de disputar naquele ano e passa a concentrar seus esforços em preparar o carro da próxima temporada. Então, por que muitas empresas não fazem o mesmo?

Candreva aponta que este tipo de foco é algo muito mais comum nas startups e pequenas empresas do que nas grandes corporações, e ele tem um motivo muito claro do motivo disso acontecer: “é que se ela errar, ela morre. E isso faz com que exista uma força, uma necessidade de acertar, de correr atrás daquilo que é estritamente necessário, e isso faz a pessoa ter um foco muito grande.”

E isso é muito claro quando comparamos a história de famosas startups que fracassaram com os fracassos de empresas como a Apple. A empresa da maçã pode investir mais de US$1 bilhão em um projeto de carro que nunca foi nada mais do que um protótipo, e mesmo assim ver suas ações se manterem mais ou menos no mesmo patamar de antes. Enquanto isso, qualquer projeto fracassado de uma startup normalmente significa que aquela empresa vai precisar finalizar suas operações.

E este foco é um dos grandes desafios para as empresas hoje: afinal, como focar quando literalmente tudo parece mudar a cada ano? E aí talvez precisamos exercitar uma habilidade muito importante no futuro pós-IA: a de sermos críticos e saber fazer perguntas.

Complexo, mas simples

Ao longo de sua experiência profissional como consultor, uma das coisas que Candreva percebeu é que muitas vezes a operação das empresas entra em um “fluxo automático”, onde as coisas são feitas de um jeito mas ninguém sabe explicar o porquê. Isto acontece porque nós somos condicionados a muitas vezes só aceitar as coisas e replicá-las sem questionar – e conseguir criar um senso crítico à capacidade de questionar, é o tipo de mudança fundamental na educação que precisamos fazer na preparação para o futuro pós-IA.

Saber fazer as perguntas certas pode nos ajudar a resolver problemas que, num primeiro momento, parecem muito complexos. Candreva lembra o caso de uma empresa de hotéis pra qual prestou consultoria: ela tinha um hotel, daqueles tipo resort, muito procurado e que, no papel, era perfeito: atendimento impecável, o lugar em si era lindo, e ainda tinha um belo parque aquático onde as crianças podiam se divertir. Mas ele tinha um grande problema: a fila do check-in às vezes chegava a durar quase 1h. E isso criava um problema grande, porque as pessoas chegavam lá para ter um fim de semana perfeito, mas a primeira impressão que tinham era algo negativo.

A solução para isso não precisou de uma grande mudança tecnológica, com integração de IA em todos os processos. Porque, ao fazer as perguntas certas, o futurista percebeu que tudo aquilo podia ser resolvido com a “boa e velha” tecnologia do QR Code: assim que as pessoas faziam a reserva, elas já podiam preencher o check-in no site e, quando chegavam no hotel, era só escanear um QR Code e o quarto seria liberado.

Já o Igor teve uma outra experiência com hotéis onde o mesmo problema era resolvido de uma forma diferente: um hotel que atendia as pessoas que estavam chegando para participar do C2 Montreal, um festival de inovação comandado por nada menos que o Cirque du Soleil. A organização do evento usou o saguão do hotel como palco para uma performance, transformando a fila do check-in em uma experiência cultural inesquecível para quem estava lá – e fez com que ninguém se preocupasse em ficar horas na fila. Tanto que muita gente continuou no salão para assistir a apresentação mesmo depois de finalizar o check-in.

Em ambos os casos, a solução para o problema da fila não passou pela instalação de tecnologias de IA generativa de última geração, mas em fazer as perguntas certas: “onde está o meu problema?” e “o que eu posso fazer para resolvê-lo?” Em alguns casos, a resposta pode ser “acabar com a fila”, em outros, “transformar o momento da fila em algo positivo”; mas não importa qual a resposta, tudo começou fazendo as perguntas certas.

E este talvez seja o norte que muitas empresas precisam para atravessar este momento de mudanças: fazer as perguntas certas para entender a posição que você está, para onde quer ir, e como pretende chegar lá. 

Simples, mas complexo.

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